domingo, 27 de março de 2022

O músico, a orquestra e o maestro

Silvio Romero comemora seu gol contra o Náutico com 
Yago Pikachu. (Foto: Fábio Lima/O Povo)

O Fortaleza voltou a vencer, foi a décima vitória em catorze partidas. A equipe permanece invicta, empatou os outros quatro jogos, marcou 33 gols com uma média de 2,36 gols por jogo e sofrendo apenas 8 até aqui.

Ainda diferente da intensidade que encantou toda a América do Sul ano passado, a equipe é uma orquestra com um músico talentoso e um condutor que vai se redescobrindo de olho nos próximos dez dias valendo uma Copa do Nordeste e a inédita estreia da Copa Libertadores contra o chileno Colo-Colo.

O MÚSICO

Vojvoda comandando treino no Pici.
(Foto: Leonardo Moreira/FortalezaEC)

Técnico talentoso, eleito o melhor do futebol cearense no ano passado e para muitos o melhor do país, o argentino Juan Pablo Vojvoda não é um músico de uma orquestra só. Seja pelo seu Defensa y Justicia, algoz do São Paulo na Sul-Americana de 2017, ou seu Unión La Calera vice-campeão chileno, em 2020, 'El Doctor' buscava uma orquestra para colocar seu nome de vez entre os principais do continente.

Eis que no dia 4 de maio, o Fortaleza que buscava se firmar no cenário nacional brasileiro aposta no promissor treinador e o contrata. O resultado foi imediato, título cearense invicto, o primeiro em quase 60 anos e depois incríveis semifinais da Copa do Brasil e um Top 4 no Campeonato Brasileiro, melhor posição de um time do Norte-Nordeste na era dos pontos corridos e vaga direta na fase de grupos da Libertadores, estava na moda, o Leão do Vojvoda. 

Uma equipe intensa, agressiva e no limite, essa foi a ordem de 2021, mas a primeira característica não parecia ser tão presente na atual temporada. Porém, não se enganem, o repertório é incrível. Ontem contra o Náutico, o Fortaleza entrou com: Max Walef; Tinga (Anthóny Landazuri), Marcelo Benevenuto e Titi; Yago Pikachu, Zé Welison, Matheus  Jussa (Felipe), Juninho Capixaba e Lucas Lima (Matheus Vargas); Róbson (Silvio Romero) e Renato Kayzer (Romarinho).

A ORQUESTRA

Jogadores comemoram gol de Róbson
(Foto: Fábio Lima/O Povo)

Desde o início, no papel, o Fortaleza sempre se portou no 3-5-2. São três jogadores na linha inicial, mas entre eles sempre um que não é zagueiro ofício, uma linha de cinco na intermediária e dois atacantes. Só que ver esse time 'in loco' é diferente do que pranchetas e números frios. Apesar de não mostrar a intensidade de outrora, o repertório é simplesmente encantador para aqueles que gostam do futebol bem jogado e de uma equipe de bastante movimentação.

Vamos começar pelo bloco defensivo inicial. Na hora de se defender, a linha varia entre três jogadores em diferentes variações. Seja Tinga, Benevenuto e Titi, ou até quando Titi sobe para dar o primeiro bote e Matheus Jussa faz a função de um terceiro mais pela esquerda. 

Em outros momentos, o time se defende em uma linha de quatro, puxando Tinga para a lateral, descendo Juninho Capixaba para a linha final com Benevenuto e Titi centralizado. Se a linha estiver bem baixa, até mesmo uma linha de cinco é possível com Tinga indo para dentro e Yago Pikachu ou até mesmo Lucas Lima fechando a lateral-direita.

Na transição ofensiva, Tinga (ou Landázuri que entrou durante o jogo) e Titi saem mais, até trocam de posição. Zé Welison e Jussa em vários momentos vieram para a zaga para suas infiltrações, em outros momentos, ambos mais abertos faziam dobradinhas e infiltrações com os alas Pikachu e Juninho Capixaba. Nas raras vezes que Benevenuto sobe, Jussa fecha o meio, isso se torna mais comum com Felipe em campo, por conta da característica de passe longe ser mais apurada.

No ataque, as mudanças são constantes. Vojvoda ignora totalmente a necessidade de um 9 físico. Se aproveitando das linhas altas do Náutico, não quis velocidade e deixou Romarinho e Moisés como opções de banco. Começou com Kayzer e Róbson, o objetivo era a bola longa ou a bola escorada, algo que vimos muito com Tinga de ponta na era Rogério Ceni. 

As mudanças foram mais claras com as substituições, quando Vargas entrou no lugar de Lucas Lima, não foi seis por meia dúzia, Matheus afunilou no setor de ataque, era mais próximo de um falso 9 do que um meia, o intuito era brigar pela bola.

Romarinho que teve a função de substituir Lucas Lima, eis a armadilha. Romarinho flutuava pelas pontas e setor intermediário buscando abrir espaços e o final disso tudo se deu com Silvio Romero, cinco minutos mais acréscimos foram o suficiente para mostrar a marca final dessa orquestra.

'El Chino' diferente do que se espera abriu pela esquerda deixando Vargas ainda como referência, aos poucos foi descendo, centralizando, mas ainda uma linha atrás do meia-central e no momento do gol é que se mostra o porquê disso. A defesa adversária não vê o movimento de flecha que nem velocidade foi. Romero se posicionou como um segundo atacante, daqueles clássicos dos anos 90, se aproveitou que a marcação se fixou em quem ficou de referência (Matheus Vargas) e livre infiltrou para marcar um golaço. Nada disso foi coincidência, tudo para de uma orquestra. 

Durante o jogo ela variou de muitas formas. Defendeu de forma alta no 4-3-1-2, 4-2-2-2, 4-4-2 e até mesmo 4-3-3 dependendo do posicionamento de Yago Pikachu e principalmente de Lucas Lima. 

O MAESTRO

Lucas Lima se prepara para bater falta.
(Foto: Mateus Lotif/Fortaleza EC)

Criticado no começo da temporada até por esse que vos escreve, Lucas Lima vem sendo o maestro dessa orquestra. Vê-lo na TV não dá real proporção de sua influência em campo. Atuando de regista e até mesmo de volante em alguns momentos no início da temporada, o experiente jogador é o termômetro, o maestro, o comandante de todas as funções da equipe em campo. 

Lucas é aquele jogador que só é marcado se tiver alguém 90 minutos fixo em cima dele e mesmo assim seria difícil segurá-lo. Acompanhá-lo em campo é entender a ausência de assistências ou gols, até aqui. A orquestra se movimenta de acordo com sua posição em campo. 

Por vezes ele é meia-armador, organiza a distribuição de jogo no setor ofensivo, às vezes vai para as pontas, dobrando e até alternando com os laterais, especialmente pelo lado-direito. Em alguns momentos, Com Lucas na ponta-direita e Kayzer na ponta-esquerda o Fortaleza atacou no 4-3-3, mas sua principal movimentação vem quando ele fecha de regista, é com ele organizando a transiçao da zaga para o meio-campo que o time ataca de forma mais organizada, seus passes longos e passe para infiltrações de Pikachu, Tinga e Juninho Capixaba criam boas situações ofensivas.

Vojvoda achou seu maestro, a orquestra tem que a coordene e se juntar esse material com 'un equipo intenso, un equipo agressivo, agresivo, que jogue al limite, sin expulsión, sin tarjeta, pero limite e principalmente, un equipo inteligente', tem tudo para ter um 2022 ainda mais mágico do que o ano anterior.

Por Luca Laprovitera
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