(Foto: Leonardo Medeiros/Fortaleza EC) |
Domingo começa a caminhada do Fortaleza na Série A. Será um choque de realidade, nos últimos 10 anos ao menos, o Leão entrava em campo quase sempre como favorito, ao menos em proximidade ou igualidade com seu adversário.
O torcedor agora terá de se acostumar com nova postura, com nova cobrança, com uma nova realidade e não será fácil. Desde que Jorge Mota foi eleito no fim de 2014, junto com Enio Mourão e Evangelista Torquato, foi-se levado um jovem chamado Marcelo Paz como Diretor de Futebol, a partir dali se dava seguinte, firme, em um planejamento de futebol que hoje vemos.
Em 2014, Marcelo Chamusca é contratado pelo Fortaleza. O clube traz nomes experientes como Corrêa e Marcelinho Paraíba, emergentes como Guto, fixa no time principal Walfrido e Edinho, mantém Robert e Waldison. Pela primeira vez vemos o 4-3-3/4-2-4 que hoje estamos acostumados.
Chamusca usava fortemente suas pontas com Edinho e Waldison, além de laterais fortemente ofensivos como Tiago Cametá e Fernandinho, um centroavante mais forte, brigador (e fazedor de gols), além de sempre ter volantes com boa saída. A mudança de Diretoria não mudou a ideia, tanto que Chamusca mesmo sem subir teve seu contrato renovado.
Porém, com proposta do Atlético-GO, o técnico acabou saindo antes mesmo do início da pré-temporada. Nedo Xavier, um técnico mais reativo assumiu. Foi recebendo nomes como Pio, Daniel Sobralense, Wanderson, Everton, Dudu Cearense, mas não conseguiu dar cara ao time, e Chamusca sem sucesso em Goiás, retornou.
O 4-1-4-1, que se tornava um 4-3-3/4-4-2 fez muito sucesso durante o primeiro semestre. Pio e Everton abertos, um volante de mais saída como Vinícius Hess e Corrêa de regista, armando o jogo a partir da defesa. Sobralense jogava mais recuado, como um meia central, muitas vezes na mesma linha de Hess para facilitar o jogo dos pontas, mas sacrificando o centroavante. O jogo mudou com a queda de rendimento de Pio, trazendo Sobralense para a direita, e trazendo Maranhão mais a frente, além de Auremir ganhar a vaga de Hess no meio.
Os times de Chamusca tinham como característica a posse de bola, as triangulações pelas pontas, o forte jogo aéreo nos cruzamentos de Corrêa, Pio e Everton, parece com algo que conhecemos hoje?
Outro ano sem subir e a diretoria aposta em Flávio Araújo. Técnico local, também sem característica de jogo mais "moderno", mas ofensivo, aposta em um meio-campo mais dinâmico e de posse com Corrêa, Dudu Cearense, Daniel Sobralense, Elias e Everton, com Felipe e Jean Mota nas laterais e experiente, mas ágil Anselmo de referência.
O time faz muitos gols, mas também sofre na recomposição e logo os problemas aparecem, forçando a busca por um volante. Com resultados irregulares, Marquinhos Santos chega ao Pici e logo dá nova cara ao time. Fecha um forte linha de 4 e usa o elenco de forma inteligente, defendendo com precisão e usando o meio-campo de ágil contra golpe com perigoso 4-1-4-1 defendendo, onde Juliano fazia frente a zaga, com Dudu Cearense e Jean Mota centralizados, Everton e Juninho nas pontas.
Atacando no 4-2-3-1, subindo Jean como um terceiro homem de meio-campo, tendo sempre opções como Pio, Corrêa e Daniel Sobralense. Com as saídas de Jean e Dudu, o time mudou de forma e de esquema. Corrêa e Daniel voltavam ao time titular. Sobralense se tornou um enganche, com o time defendendo no 4-4-2 e atacante no 4-2-4, com Sobralense na sobra de Anselmo, Juninho (e depois Rodrigo Andrade) e Everton nas pontas, além das chegadas fortes de Corrêa.
Marquinhos sai antes do mata-mata, Hemerson Maria assume e mantém tudo, mas não sobe. Terceiro ano sem subir, crise, eleições conturbadas, Marcelo Paz sai debaixo de críticas da Direção de Futebol, Enio Mourão assume e contratam César Sampaio como Executivo, além da manutenção de Maria no cargo de treinador.
Em 2017, o Fortaleza começa a montar um elenco mais reativo, de jogadores mais focado em um jogo de força do que de técnica. Mesmo assim, Maria fixa o 4-3-3 que nos seguiu por duas temporadas inteiras. Dois pontas velozes, dois volantes saindo pro jogo, um meia central para distribuição e recomposição, dois laterais com força física e presença de área.
Maria não atinge resultados e sai, César Sampaio pede demissão e Marcelo Paz volta ao posto de Diretor de Futebol, Marquinhos retorna, não consegue dar cara ao time e também sai. A Diretoria se desliga, Marcelo Paz assume com Marcello Desidério uma espécie de presidência interina até Luís Eduardo Girão assumir o cargo. Paz se torna o 1º vice.
Paulo Bonamigo chega para a Série C e mantém a forma de jogo. Para ganhar qualidade na saída de bola, improvisa Rodrigo Mancha na zaga, aposta em laterais altos como Felipe e Bruno Melo, no meio, 3 volantes, Pablo para fazer a troca com Felipe pela direita, algo que já acontecia no início do ano com Jefferson. Uchôa como primeiro homem para sair com a bola e Adenilson para maior criação.
O time tinha posse, mas não tinha criatividade, mas tinha ágil contra-golpe e assim fez ótimo primeiro turno. Porém ficou pragmático, quase se complica e Bonamigo cai faltando 3 rodadas para o fim da Primeira Fase. Vem Antônio Carlos Zago que faz apenas uma alteração, sai Adenilson e entra Leandro Lima. O time começa a rodar a bola, segurar o jogo, o 4-3-3 não se torna temeroso, mas eficaz, mesmo sem grandes finalizadores, o Fortaleza assim finalmente sobe.
Sem Zago que decidiu voltar para o Juventude, Paz agora presidente pela renúncia de LEG, mantém o plano de um time dinâmico, moderno, de posse e aposta alto, sem medo, e acerta com Rogério Ceni. O casamento é perfeito, mesmo demorando à engrenar.
O Fortaleza buscava a evolução desse tipo de jogo, buscou jogadores para uma Série B condizentes com essa característica, trouxe o técnico disponível no mercado com maior capacidade de introduzir. As mudanças físicas, táticas, ideológicas que eram pensadas e sonhadas desde 2015 finalmente vão saindo do papel.
O começa é difícil, Ceni demora a achar um esquema, testa 3 zagueiros, 3 volantes, mas é na variação do 4-3-3/4-5-1 que acha o time campeão da Série B de forma arrasadora. Em 2019, o time não demorou tanto a se achar, mas agora irá precisar se redescobrir.
Na Série A tem a missão de manter essa identidade de jogo de pé em pé, do toque de bola, da velocidade, mas com maior cuidado com a defesa, o 4-2-4 que vimos lá em 2014 e hoje voltou a evidência, não com um meia mais ofensivo como Marcelinho Paraíba que jogava como um segundo atacante, mas com Júnior Santos e sua velocidade auxiliado por pontas construtivos como Osvaldo e Edinho, ou até mesmo afrontosos como Marcinho, terá a opção mais a frente de um 9 mais fixo e guerreiro como Wellington Paulista ou veloz e infiltrador como Kieza.
As laterais continuam altas, ou com Tinga e o possível retorno de Bruno Melo, ou ao menos com a boa impulsão de Carlinhos. Os volantes que jogam de lateral e até ponta, sempre de boa saída como Felipe, Araruna, Gabriel Dias ou Paulo Roberto, até mesmo Dodô ou Marlon. A posse de bola de 60-70% não irá aparecer na boa maioria dos jogos, o time irá "sofrer" como dizemos no futebol.
De fato iremos ver um Fortaleza novo, mas que já vimos, uma repaginada do nosso velho conteúdo com o melhor escritor possível. Nas mãos de Ceni teremos uma nova obra, de velhas novidades, mas que encanta e que terá o compromisso de fazer orgulho, independente do resultado, desde que se jogue para cima, como Fortaleza, com raça, com a identidade que os mais velhos viam nos times dos anos 70 com Moésio Gomes em o quarteto de ouro, ou da Jangada Atômica de Ferdinando no início da década passada, mesmo que jogue se defendendo, jogando para frente, um time que não joga só com resultado e sim com ideias.